O PONTO DE VISTA DA GARUPA

Texto e fotografias: Raquel Trindade

Quando falo para minhas amigas que irei viajar e percorrer mais de 1000km em cima de uma moto,o espanto é geral e me causa certa graça! Sim, porque elas não entendem o prazer de estar em uma moto.

Pensam de forma equivocada que o risco de um acidente é iminente e certo, que o corpo irá doer de forma insuportável, que irei passar muito frio ou muito calor, enfim, desconfortos que pensam eu não teria a bordo de um avião.

Como estão enganadas as minhas amigas! Tenho prazer em estar na moto com meu marido, na garupa, sendo sua companheira na chuva, no frio,na altitude....
Sou eu quem muitas vezes quer percorrer uma maior quilometragem no dia, pois tenho ganas em conhecer muito do lugar que iremos visitar.


Estar na moto é mais que um prazer!


Nos primeiros quilômetros da viagem, a gente ainda pode carregar uma preocupação ou algum problema que inevitavelmente faz parte do nosso dia a dia, e que tentamos disfarçar ou esquecer, olhando a paisagem e ouvindo musica.

Nos dias seguintes, nada mais resta na mente e mesmo a paisagem e a musica se fundem em algo que chamo de meditação.

Minha satisfação é tanta que medito nestes percursos e por conta disto, não costumo ter dor alguma quando estou em férias.Algo que me faz acreditar que a dor física é um estado mental.

Acidentes acontecem por imprudência ou acaso, sei lá.


Já cai da moto em um acidente besta numa estrada de rípios e não tive nenhuma lesão, a não ser o susto que me fez arrepiar por muito tempo quando me deparava com as pedras na estrada.

Superada a questão, sonho literalmente que sou eu quem pilota, mas acordada não tenho nenhum interesse em sair da garupa.

RAQUEL TRINDADE

Tenho predileção por viagens longas e estradas solitárias.

Na Argentina, na maioria das estradas, é assim que se viaja, longos trechos sem ver ninguém, um ou outro veículo que ora passa.
Também gosto de viajar sem companhia de terceiros, apenas eu e meu marido. O entrosamento é muito interessante e acredito que valha mais que terapia de casal, ou o casamento estraga de vez ou se qualifica a relação.

Além disto, aprecio muito o contato com as pessoas que encontramos no caminho e deixo o mérito a meu esposo,uma vez que ele tem mais facilidade em comunicar-se do que eu e principalmente quando encontramos outros motociclistas, sozinhos ou não, com quem trocamos idéias sobre o trajeto e afins.O fato é que fazemos amigos temporários ou permanentes, jogando uma conversa fora, bebendo algum vinho a noite na companhia de pessoas que jamais havíamos visto anteriormente. Já tive o prazer de estar em uma mesa com diversas nacionalidades latino americanas, no Atacama isto é possível. Esta camaradagem, esta aproximação é muito interessante e me trás a mente uma frase citada por Clodoaldo Turbay Braga em seu livro, Alaska- Além do Circulo Polar Ártico, que diz:
“Talvez haja pessoas que vivem em paz e lucidez, sem fantasmas que os persigam que não vêem nada em uma tempestade além de correntes de ar e vapor. Existem os que se inquietam e investigam o planeta em que vivem.

Mas o que transcende a isto é a procura por conexões livremente oferecidas e aceitas, para confirmar que o mundo e nós, apesar de tudo, temos pontos em comum”.


“Nada é mais importante que tentar descobrir estes pontos”. Ted Simon


Na busca dos pontos em comum, com a mente aberta, é assim que viajo e que aprecio a cultura em suas diferentes formas, a sensação térmica e tudo mais que faz parte de uma viagem.


Raquel Trindade

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