POR UMA ALDEIA TOUAREG

Em Merzouga, no Deserto do Saara, ao longo da estrada principal, haviam vilas que pareciam estar abandonadas. Aquilo me despertou uma grande curiosidade e resolvi entrar. Na medida que seguia com a minha motocicleta observava lentamente pessoas aparecendo nas portas e nas lajes dos Adobe. Percebi que se tratava de uma aldeia de Tuaregues. Me senti retraído, ressabiado, pois as pessoas não expressavam receptividade, somente curiosidade.

Deveriam estar pensando: "O que este estranho está fazendo por aqui". Mas com toda cautela ali parado, ainda sentado na motocicleta desliguei o motor e tirei meu capacete.

Podia sentir que cada vez mais apareciam pessoas. As mulheres de um lado, as crianças me abordando com sorrisos, mas com uma fisionomia que não escondia que havia uma parte de tristeza naqueles olhos pedintes. Ali retirei algumas bandeirinhas do Brasil que carregava comigo e as distribuí na proporção que meu braço alcançava. Tenho plena convicção que estas crianças sequer tinham noção do que representava aquela bandeira para minha pessoa, mas davam-se por satisfeita com a oferta.
Em determinado momento um homem se aproximou da motocicleta e eu, ainda curioso e apreensivo aguardava o que aquele homem estaria por anunciar. Ele parou a uns dois metros da motocicleta e me disse algo em árabe. Eu gesticulei pra ele sinalizando que não entendia árabe. Ele ficou me olhando e segundos depois virou-se, onde cerca de uns vinte beberes me observava sem sequer pronunciarem qualquer palavra.

Saltei da motocicleta e lentamente abri a mala lateral para pegar uma caixa de Toblerone, e mostrei-o o chocolate e as as demais barras ali armazenadas, lhe entregando uma. O homem lentamente pegou a caixa das minhas mãos, me deu as costas e caminhou até o interior de uma Adobe onde os demais homens se concentravam.


As crianças já tinham se afastado e permaneciam próximas das mulheres. Repentinamente apareceu um senhor de dentro daquela Adobe, chegou na porta, me olhou por uns alguns segundos e retornou lá pra dentro.
















A retribuição veio de forma inesperada

Em seguida este mesmo homem o qual lhe dei a caixa de Toblerone veio na minha direção com um objeto na mão que, naquele instante em razão da distância, não identifiquei. Mas podia observar que o seu semblante era pacífico. Não sorria com a boca, mas o seu olhar dava a entender que estava querendo agradecer a minha oferta.















Vi, a medida que este mesmo homem se aproximava que trazia em suas mãos uma “faca” dentro de uma bainha. Ele me ofertou a faca como se fosse uma moeda de troca, me mostrou o acabamento do couro que envolvia a lâmina, totalmente artesanal. Uma bainha de couro de camelo com detalhes em pele de serpente.

Peguei a faca, admirei aquela peça artesanal e fiz-me entender que estava muito agradecido. Guardei o presente na mala da motocicleta, e ali mesmo já retomei a minha posição de pilotagem e continuei para o meu destino. Mesmo sem qualquer palavra de ambas as partes, mais uma vez sentia que estar naquele território era uma oportunidade de viver o clima místico com aquela recente experiência!

Naquele instante já tinha comigo a primeira lembrança de uma tradição marroquina

Fui um momento marcado por um escambro no meio de muita curiosidade e expectativas, mas saí dali certo de uma coisa: Na vida “é dando que se recebe”... seja qual for a cultura ou credo, mas um gesto desprendido para as pessoas de bem, é sempre interpretado como uma ação de paz!

Abraços,

Eduardo Wermelinger