Perseguindo o Amanhecer - Ricardo Lugris

14/09/2015 - No extremo oriental da Rússia

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Com a certeza de que a parte mais exigente, tanto física, quanto mentalmente nesta viagem, vai chegando ao fim, preparo - me para deixar Vladivostok no extremo oriental da Rússia, em um ferry que me levará, em dois dias de navegação, até o Japão, um país desconhecido para mim. (com exceção de uma curta missão a Tóquio há muitos anos)
Inicia - se uma muito esperada etapa de descoberta, de observação e análise de culturas praticamente desconhecidas para mim, apesar de meus muitos anos e muitas milhas percorridas por esse vasto mundo.
Mas antes de me lançar a culturas exóticas, ainda tenho que sair da Rússia.
Pelo sistema russo, não podemos embarcar no navio com a moto, portanto, esta deve ser depositada em zona alfândegada no porto no dia anterior à partida do navio.
Ao deixar a moto no porto, vejo que duas outras motocicletas também esperam o embarque.
Uma, do coreano Chan, que viajou comigo algumas centenas de quilômetros, entre Khabarovsk e Vladivostok e a segunda moto é uma extraordinária surpresa.
Uma Harley Davidson extremamente bem equipada, inclusive com pneus de enduro, e que pertence a Eric Lobo,
um viajante motociclista bem conhecido na França que há 5 anos fez uma viagem ao redor do mundo, detendo - se longamente na Rússia onde fez matérias com Moto Clubes russos e publicou um livro que li há poucos meses, quando ainda estava buscando informações sobre o roteiro de minha viagem.
O despachante aduaneiro me informa que Eric Lobo vai até a Coréia, no mesmo navio que segue até o Japão.
O mundo é realmente pequeno.
Tive a oportunidade de ser apresentado a esse escritor/motociclista ainda na França mas não houve tempo hábil e ele partiu para uma nova viagem, dois meses antes de mim.
Como um turista comum e corrente, aproveito o belo dia de sol para passear na magnífica cidade portuária de Vladivostok.
Dinâmica e isolada, ela se desenvolve sozinha, sem depender muito do governo central, distante de 10 horas de vôo.
Embarco na manhã seguinte sem saber ao certo se minha preciosa moto está também a bordo dessa velha embarcação de passageiros e carga.
Falo com o gerente da companhia navieira e ele me confirma que tudo está bem. Prefiro, para minha paz de espírito, acreditar nele. Já imaginaram chegar do outro lado do Mar do Japão e descobrir que a moto continua na Rússia?
Já no terminal de embarque conheço o Eric Lobo e, por mais uma dessas curiosas coincidências do motociclismo de viagem, estamos dividindo a mesma cabine.
Paguei um bilhete de segunda classe, mais barato, e as cabines são para oito pessoas.
Estamos em cinco. Eric e sua namorada, dois coreanos e eu.
As camas, em forma de beliche, são provistas de cortinas, assim, garante - se uma certa privacidade.
Tudo é limpo e bem organizado.
Mal saímos do porto, somos soicitados pela tripulação a deixar o convés pois o navio começa a balançar de forma bastante pronunciada.
Recebo uma mensagem de Graça pelo satélite onde ela me fala de um tufão e de enchentes pelo Japão.
O tufão teria atingido o Japão na noite anterior e nós, pelos dois dias de navegação, vamos pegar os ventos remanescentes que provocam ondas entre três e seis metros de altura.
Sobretudo durante a noite, o vento soprou forte fazendo bem chacoalhar a velha banheira de bandeira panamenha e operada por uma empresa de navegação coreana.
Logo após a partida, muito cordialmente, Eric me convida a fumar um charuto cubano e tomamos algumas doses de Jack Daniels no deck do navio, antes que ele se veja obrigado a se recolher em função do iminente enjôo.
Felizmente, eu sou imune ao mal de mar. E reconheço que não foi nada fácil para muitas pessoas a bordo.
A travessia dura 22 horas entre Vladivostok e Dong Hae, na Coréia e depois, mais 15 horas até o porto de Sakaimato, no Japão.
Desembarquei em torno das 9 da manhã e me dirijo ao controle de passaportes.
Cordiais e minuciosos, os agentes de imigração e alfândega não deixam nenhum detalhe sem verificar.
Uma vez feita a imigração e alfândega pessoal, acompanhado de um funcionário da companhia, retorno ao navio para retirar a moto e levá-la, por sua vez para a inspeção.
Com luvas brancas e uma máscara hospitalar, o agente japonês verifica cada valise, bolsinha e detalhe da moto.
Uma por uma, retirando tudo de seu interior, com uma paciência oriental quase irritante.
Uma vez satisfeito de que não havia nada de ilegal, vem com um paninho e o esfrega em vários lugares da moto.
Para a detecção de drogas, diz ele.
Aparentemente os cães estão fora de moda.
Perderam o emprego para um computador...
Aliás, tudo é super high-tech, a câmara infravermelho que detecta se algum passageiro tem febre, as impressões digitais cujas instruções são dadas na língua do passageiro com a introdução pelo agente do respectivo passaporte na máquina., etc.
Na sequência tenho que apanhar um táxi e ir a uma cidade 50 km de distância para fazer validar pela Federação de Automóveis do Japão o meu Carnet de Passage, documento que, per si, é uma garantia e, para o qual tive que deixar um depósito na França no valor da BMW a ser restituído no meu retorno com a moto.
O Carnet é exigido pelo Japão e por vários outros países como certeza de que o viajante não venderá localmente o seu veículo.
Fiz a "garantia da garantia", como exigido pela burocracia local, em uma produção de papel com total descaso pela Amazônia, e tambem a tradução de minha Carta de Habilitação ao japonês e retorno à alfândega no porto.
Sempre minuciosos e amáveis, verificam e copiam todos os documentos e me fornecem finalmente o carimbo que preciso no Carnet.
Volto ao terminal do porto e espero pela chegada da empresa que deverá organizar o seguro contra terceiros pela duração de minha estada no Japão.
Uma vez feito tudo isso, ainda preciso aguardar quase uma hora para ter a autorização da alfândega japonesa p ara finalmente poder retirar minha moto e circular pelo Império do Sol Nascente!
Saio irremediavelmente do porto perto das 16 hs.
Foram 7 horas em função burocrática com as autoridades mas, finalmente, estou no Japão com minha moto. Hai!
Volto ao terminal do porto, e no escritório da compañía de navegação conecto à Internet e reservo um "Ryokan" , uma pousada tradicional japonesa para começar a entrar no clima e na experiencia deste exótico país.
Obviamente não espero aventura nem adrenalina em um dos mais desenvolvidos países do planeta.
Meu objetivo no Japão será uma imersão, na medida do possível, nesta estupenda cultura milenar em um país que faz tudo, ou quase tudo diferente dos demais mas sempre com uma disciplina e determinação admiráveis.
Seu povo, seus costumes, sua cozinha, seu modo de vida, em suma, suas tradições, provocam em mim uma grande curiosidade de viajante. Obviamente, será um "gaigino" a observar e, portanto, com grande tendência à par ia lidado, pelo que peço a indulgência antecipadamente.
É uma cultura que é para nós, brasileiros, tão próxima e ao mesmo tempo absolutamente distante.
Também nos próximos dias ficará evidente o contraste abissal com os 40 dias vividos na travessia da vasta, agressiva e individualista, Rússia.
O choque do contato humano atencioso e de emoções por pequenos gestos, pequenas amabilidades, ainda está por vir.
As próximas semanas serão de uma grande descoberta sempre com a dinâmica e movimento que permite a viagem em duas rodas.

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